A empresa China Sonangol Internacional Limited (CSIL) foi condenada pelo Tribunal Superior da Região Administrativa Especial de Hong Kong a restituir um empréstimo de USD 240 milhões concedido pela petrolífera estatal angolana Sonangol.
Segundo revelou em tribunal em Angola um alto funcionário da petrolífera, Hélder Pires Ferreira, além da acção civil movida pela Sonangol E.P. com vista a recuperar este valor será desencadeada uma outra judicial, em Hong Kong, focada na recuperação de outros bens envolvidos nesse negócio.
Segundo documentos judiciais citados pelo jornal O País, já em junho de 2019 um tribunal de Hong Kong tomou uma decisão favorável à petrolífera nacional contra a CSIL, após um recurso requerendo a aplicação de medidas cautelares para impedir alienação de activos, nomear representantes, restringir direcção e proteger funcionários.
Segundo a mesma fonte, a Sonangol E.P. requereu ao tribunal que proibisse a empresária Lo Fung, esposa do magnata Sam Pa, e os seus colaboradores directos de alienar ou dispor de activos arrolados no processo, bem como a possibilidade de nomear um representante da petição nos conselhos de administração da referida empresa.
Nesta acção movida contra a CSIL, estavam também arroladas as empresas New Bright International Development Limited e Fung Yuen Kwan Veronica e os cidadãos Maldito Bong Harry, Martin Cheunge Lim Siew Chin Diana.
O tribunal anuiu à providência cautelar, o que permitiu que a pessoa nomeada pela Sonangol tivesse poder, como signatária, de aceder às contas bancárias relevantes e de impedir que certos réus actuassem como directores nestas empresas.
A detenção de Sam Pa, em outubro de 2015, acabou por colocar em causa a continuidade do negócio que estava a ser levado a cabo pela CSIL, dado que Lo Fung limitou, a partir de maio de 2017, o acesso da Sonangol a informação sobre as actividades desta empresa, responsável pela venda do petróleo extraído de Angola.
“Embora ela detivesse acções da New Bright, ela fê-lo como nomeada do seu marido ou parceiro, Sam Pa, que havia sido fundamental na formação e desenvolvimento do Grupo até ser detido no continente em outubro de 2015”, refere o acórdão da providência cautelar citado pelo jornal angolano.
A operação começou a ficar comprometida em janeiro 2017, quando a maioria dos membros da equipa sénior de gestão, baseada em Singapura, anunciaram renunciar, de acordo com o requerimento que a Sonangol E.P. deu entrada em tribunal.
A petrolífera nacional invocou, como primeiro factor, o desconhecimento da regra básica de gestão internacional “conheça o seu cliente”, decorrente da ligação estabelecida por Sam Pa, por parte da nova líder. “Em segundo lugar, a atitude pouco cooperante da Sra. Fung ao lidar com os assuntos do grupo e, em terceiro lugar, os litígios entre a madame Fung e a senhora Lo, na sequência da detenção de Sam Pa”.
Segundo O País, a equipa de gestores de Singapura continuou a administrar a maioria dos principais activos do grupo, muitos dos quais eram propriedades de elevado valor, como o imóvel n.º 23 de Wall Street, Nova York, nos EUA, e vários outros em diferentes partes da Ásia, incluindo a China Continental, Singapura, Hong Kong e Indonésia.
Os empréstimos concedidos à CSIL também têm sido objecto de análise no processo-crime que corre na Câmara Criminal do Tribunal Supremo angolano. Segundo a acusação, elaborada pelo Ministério Público (MP), apesar de não ser instituição vocacionada a conceder empréstimos, principalmente a instituições estrangeiras, a Sonangol E.P. emprestou USD 450 milhões, em diferentes ocasiões, à empresa CSIL e, passados cerca de 20 anos, não os devolveu.
O primeiro empréstimo, de USD 200 milhões, foi concedido pela Sonangol com base num contrato mútuo existente entre as duas empresas, celebrado a 18 de outubro de 2005, numa altura em que já estavam a decorreг as operações de entrega de carregamentos de petróleo à China Sonangol International Holding Limited.
Assinou o acordo, na época, em representação do Estado angolano, Manuel Vicente, na qualidade de presidente do Conselho de Administração da Sonangol, e madame Lo Fong Hung, esposa de Sam Pa, como uma das responsáveis máximas da CSIL.
“Deste contrato, a China Sonangol International Holding Limited recebeu um financiamento de USD 200 milhões e não devolveu este valor aos cofres da Sonangol EP até o momento, pois não existem registros de que assim se tenha procedido”, diz a acusação.
Por alguma necessidade que o MP não precisou no referido documento, alguns anos mais tarde os gestores da referida empresa chinesa decidiram recorrer novamente aos cofres da Sonangol E.P para obterem mais um financiamento de USD 250 milhões, pedido que foi atendido em fevereiro de 2009. O montante também não foi devolvido até março deste ano, data do arranque deste julgamento no Tribunal Supremo.
Segundo o magistrado do Ministério Público, a dívida está fixada em USD 450 milhões, que devem ser acrescidos de USD 49 milhões referentes aos juros contabilizados até final de 2011.
As autoridades angolanas estimam que o valor do juro deve ser bem maior, tendo em conta que desde a data em que foi feita a última contabilização até ao momento já se passaram mais de 13 anos.
A criação da China Sonangol International Holding Limited em Hong Kong. em 2004, resultou de uma parceria entre Beia International Development Limited (com 70%) e a Sonangol-EP (com 30%), tendo como base um memorando de entendimento que existia entre Sam Pa e as autoridades angolanas, com vista a atrair o seu investimento a Angola.
“Talvez, surpreendentemente, dada a dimensão dos negócios da CSIL e o carácter da Sonangol, os accionistas não celebraram um acordo de accionistas escrito. Afirma-se, no entanto, na petição, que a CSIL foi formada com base em certos entendimentos”, lê-se no acórdão do tribunal de Hong Kong.
Entretanto, por razões que as autoridades judiciais angolanas não precisam, em setembro de 2005 Lo Fung Hung decidiu criar, em Hong Kong, uma outra empresa denominada China Sonangol International Limited, tendo como acionista único a sua empresa New Bright International Development Foundation Limited.
As empresas, nomeadamente, a China Sonangol International Holding Limited e a China Sonangol International Limited, acabaram por estar envolvidas na parceria com a petrolífera angolana.
Os milhares de barris de petróleo que eram entregues à CSIL eram comercializados naquele pais asiático por uma equipa de profissionais que se encontrava sediada em Singapura, de acordo com o acórdão do julgamento do Tribunal de Hong Kong.
“A Singapura é a jurisdição a partir da qual grande parte dos negócios do grupo foi administrada, na qual várias subsidiárias foram incorporadas e possuem contas bancárias. O negócio do grupo era, até aos assuntos de que a Sonangol se queixa, gerido por uma equipa profissional de executivos sediados em Singapura”, lê-se no acórdão.